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Unsere Zeit

Carlos Drummond de Andrade

Nosso Tempo

[I]
Esse é tempo de partido
Tempo de homens partidos

Em vão percorremos volumes
Viajamos e nos colorimos
A hora pressentida esmigalha-se em pó na rua
Os homens pedem carne fogo sapatos
As leis não bastam os lírios não nascem
Da lei meu nome é tumulto, e escreve-se
Na pedra

Visito os fatos, não te encontro
Onde te ocultas, precária síntese
Penhor de meu sono, luz
Dormindo acesa na varanda?
Miúdas certezas de empréstimos, nenhum beijo
Sobe ao ombro para contar-me
A cidade dos homens completos

Calo-me, espero, decifro
As coisas talvez melhorem
São tão fortes as coisas!
Mas eu não sou as coisas e me revolto
Tenho palavras em mim buscando canal
São roucas e duras
Irritadas, enérgicas
Comprimidas há tanto tempo
Perderam o sentido, apenas querem explodir

[II]
Esse é tempo de divisas
Tempo de gente cortada
De mãos viajando sem braços
Obscenos gestos avulsos

Mudou-se a rua da infância
E o vestido vermelho
Vermelho
Cobre a nudez do amor
Ao relento, no vale

Símbolos obscuros se multiplicam
Guerra, verdade, flores?
Dos laboratórios platônicos mobilizados
Vem um sopro que cresta as faces
E dissipa, na praia, as palavras

A escuridão estende-se mas não elimina
O sucedâneo da estrela nas mãos
Certas partes de nós como brilham! São unhas
Anéis, pérolas, cigarros, lanternas
São partes mais íntimas
E pulsação, o ofego
E o ar da noite é o estritamente necessário
Para continuar, e continuamos

[III]
E continuamos é tempo de muletas
Tempo de mortos faladores
E velhas paralíticas, nostálgicas de bailado
Mas ainda é tempo de viver e contar
Certas histórias não se perderam
Conheço bem esta casa
Pela direita entra-se, pela esquerda sobe-se
A sala grande conduz a quartos terríveis
Como o do enterro que não foi feito, do corpo esquecido na mesa
Conduz à copa de frutas ácidas
Ao claro jardim central, à água
Que goteja e segreda
O incesto, a bênção, a partida
Conduz às celas fechadas, que contêm
Papéis?
Crimes?
Moedas?

Ó conta, velha preta, ó jornalista, poeta, pequeno historiador urbano
Ó surdo-mudo, depositário de meus desfalecimentos, abre-te e conta
Moça presa na memória, velho aleijado, baratas dos arquivos, portas rangentes, solidão e asco
Pessoas e coisas enigmáticas, contai
Capa de poeira dos pianos desmantelados, contai
Velhos selos do imperador, aparelhos de porcelana partidos, contai
Ossos na rua, fragmentos de jornal, colchetes no chão da
Costureira, luto no braço, pombas, cães errantes, animais caçados, contai
Tudo tão difícil depois que vos calastes
E muitos de vós nunca se abriram

[IV]
É tempo de meio silêncio
De boca gelada e murmúrio
Palavra indireta, aviso
Na esquina tempo de cinco sentidos
Num só o espião janta conosco

É tempo de cortinas pardas
De céu neutro, política
Na maçã, no santo, no gozo
Amor e desamor, cólera
Branda, gim com água tônica
Olhos pintados
Dentes de vidro
Grotesca língua torcida
A isso chamamos: Balanço

No beco
Apenas um muro
Sobre ele a polícia
No céu da propaganda
Aves anunciam
A glória
No quarto
Irrisão e três colarinhos sujos

[V]
Escuta a hora formidável do almoço
Na cidade os escritórios, num passe, esvaziam-se
As bocas sugam um rio de carne, legumes e tortas vitaminosas
Salta depressa do mar a bandeja de peixes argênteos!
Os subterrâneos da fome choram caldo de sopa
Olhos líquidos de cão através do vidro devoram teu osso
Come, braço mecânico, alimenta-te, mão de papel, é tempo de comida
Mais tarde será o de amor

Lentamente os escritórios se recuperam, e os negócios, forma indecisa, evoluem
O esplêndido negócio insinua-se no tráfego
Multidões que o cruzam não veem é sem cor e sem cheiro
Está dissimulado no bonde, por trás da brisa do sul
Vem na areia, no telefone, na batalha de aviões
Toma conta de tua alma e dela extrai uma porcentagem

Escuta a hora espandongada da volta
Homem depois de homem, mulher, criança, homem
Roupa, cigarro, chapéu, roupa, roupa, roupa
Homem, homem, mulher, homem, mulher, roupa, homem
Imaginam esperar qualquer coisa
E se quedam mudos, escoam-se passo a passo, sentam-se
Últimos servos do negócio, imaginam voltar para casa
Já noite, entre muros apagados, numa suposta cidade, imaginam
Escuta a pequena hora noturna de compensação, leituras, apelo ao cassino, passeio na praia
O corpo ao lado do corpo, afinal distendido
Com as calças despido o incômodo pensamento de escravo
Escuta o corpo ranger, enlaçar, refluir
Errar em objetos remotos e, sob eles soterrados sem dor
Confiar-se ao que bem me importa
Do sono

Escuta o horrível emprego do dia
Em todos os países de fala humana
A falsificação das palavras pingando nos jornais
O mundo irreal dos cartórios onde a propriedade é um bolo com flores
Os bancos triturando suavemente o pescoço do açúcar
A constelação das formigas e usurários
A má poesia, o mau romance
Os frágeis que se entregam à proteção do basilisco
O homem feio, de mortal feiúra
Passeando de bote
Num sinistro crepúsculo de sábado

[VI]
Nos porões da família
Orquídeas e opções
De compra e desquite
A gravidez elétrica
Já não traz delíquios
Crianças alérgicas
Trocam-se; reformam-se
Há uma implacável
Guerra às baratas
Contam-se histórias
Por correspondência
A mesa reúne
Um copo, uma faca
E a cama devora
Tua solidão
Salva-se a honra
E a herança do gado

[VII]
Ou não se salva, e é o mesmo há soluções, há bálsamos
Para cada hora e dor há fortes bálsamos
Dores de classe, de sangrenta fúria
E plácido rosto e há mínimos
Bálsamos, recalcadas dores ignóbeis
Lesões que nenhum governo autoriza
Não obstante doem
Melancolias insubornáveis
Ira, reprovação, desgosto
Desse chapéu velho, da rua lodosa, do estado
Há o pranto no teatro
No palco? No público? Nas poltronas?
Há sobretudo o pranto no teatro
Já tarde, já confuso
Ele embacia as luzes, se engolfa no linóleo
Vai minar nos armazéns, nos becos coloniais onde passeiam ratos noturnos
Vai molhar, na roça madura, o milho ondulante
E secar ao Sol, em poça amarga
E dentro do pranto minha face trocista
Meu olho que ri e despreza
Minha repugnância total por vosso lirismo deteriorado
Que polui a essência mesma dos diamantes

[VIII]
O poeta
Declina de toda responsabilidade
Na marcha do mundo capitalista
E com suas palavras, intuições, símbolos e outras armas
Prometa ajudar
A destruí-lo
Como uma pedreira, uma floresta
Um verme

Unsere Zeit

[I]
Das ist die Zeit des Abschieds
Zeit der gebrochenen Männer

Vergeblich durchstreifen wir die Seiten
Wir reisen und färben uns ein
Die erwartete Stunde zerfällt zu Staub auf der Straße
Die Männer verlangen Fleisch, Feuer, Schuhe
Die Gesetze reichen nicht, die Lilien blühen nicht
Von dem Gesetz ist mein Name Tumult, und es wird geschrieben
Auf dem Stein

Ich besuche die Tatsachen, finde dich nicht
Wo verbirgst du dich, prekäre Synthese
Pfand meines Schlafes, Licht
Schläfst du hellwach auf der Veranda?
Kleine Gewissheiten von Darlehen, kein Kuss
Steigt auf die Schulter, um mir zu erzählen
Von der Stadt der vollständigen Männer

Ich schweige, warte, entschlüssele
Die Dinge vielleicht besser werden
Die Dinge sind so stark!
Aber ich bin nicht die Dinge und revoltiere
Ich habe Worte in mir, die einen Kanal suchen
Sie sind heiser und hart
Erregt, energisch
So lange zusammengedrückt
Haben sie ihren Sinn verloren, wollen nur explodieren

[II]
Das ist die Zeit der Grenzen
Zeit der zerschnittenen Menschen
Von Händen, die ohne Arme reisen
Obszöne, willkürliche Gesten

Die Straße der Kindheit hat sich verändert
Und das rote Kleid
Rot
Bedeckt die Nacktheit der Liebe
Im Freien, im Tal

Dunkle Symbole vermehren sich
Krieg, Wahrheit, Blumen?
Von mobilisierten platonischen Laboren
Kommt ein Hauch, der die Gesichter verbrennt
Und zerstreut, am Strand, die Worte

Die Dunkelheit breitet sich aus, aber sie beseitigt nicht
Das Substitut des Sterns in den Händen
Bestimmte Teile von uns, wie sie strahlen! Es sind Nägel
Ringe, Perlen, Zigaretten, Laternen
Es sind intimere Teile
Und Pulsieren, das Atemholen
Und die Luft der Nacht ist das unbedingt Notwendige
Um weiterzumachen, und wir machen weiter

[III]
Und wir machen weiter, es ist Zeit der Krücken
Zeit der sprechenden Toten
Und alten Lähmungen, nostalgisch nach dem Tanz
Aber es ist immer noch Zeit zu leben und zu erzählen
Bestimmte Geschichten sind nicht verloren gegangen
Ich kenne dieses Haus gut
Von rechts betritt man, von links steigt man
Das große Zimmer führt zu schrecklichen Kammern
Wie die des Begräbnisses, das nicht stattfand, des Körpers, der auf dem Tisch vergessen wurde
Führt zur Schale mit sauren Früchten
Zum klaren zentralen Garten, zum Wasser
Das tropft und flüstert
Inzest, der Segen, der Abschied
Führt zu den geschlossenen Zellen, die enthalten
Papiere?
Verbrechen?
Münzen?

Oh erzähl, alte Schwarze, oh Journalist, Dichter, kleiner Stadtgeschichtenerzähler
Oh Taubstumme, Aufbewahrer meiner Ohnmachtsanfälle, öffne dich und erzähle
Mädchen, gefangen in der Erinnerung, alter Lahmer, Kakerlaken der Archive, knarrende Türen, Einsamkeit und Ekel
Menschen und rätselhafte Dinge, erzählt
Staubschicht der zerlegten Klaviere, erzählt
Alte Siegel des Kaisers, zerbrochene Porzellanwaren, erzählt
Knochen auf der Straße, Zeitungsschnipsel, Klammern auf dem Boden der
Schneiderin, Trauer am Arm, Tauben, streunende Hunde, gejagte Tiere, erzählt
Alles so schwierig, nachdem ihr geschwiegen habt
Und viele von euch haben sich nie geöffnet

[IV]
Es ist Zeit des halben Schweigens
Von kaltem Mund und Murmeln
Indirektes Wort, Warnung
An der Ecke Zeit der fünf Sinne
In einem isst der Spion mit uns

Es ist Zeit der braunen Vorhänge
Von neutralem Himmel, Politik
Im Apfel, im Heiligen, im Genuss
Liebe und Unliebe, Zorn
Sanft, Gin mit Tonic
Gemalte Augen
Glaszähne
Groteske, verdrehte Zunge
Das nennen wir: Balance

In der Gasse
Nur eine Mauer
Darauf die Polizei
Am Himmel der Werbung
Vögel kündigen an
Die Herrlichkeit
Im Zimmer
Hohn und drei schmutzige Kragen

[V]
Hör die furchtbare Stunde des Mittagessens
In der Stadt leeren sich die Büros im Handumdrehen
Die Münder saugen einen Fluss aus Fleisch, Gemüse und vitaminreichen Torten
Springt schnell aus dem Meer das Tablett mit silbernen Fischen!
Die Unterwelt des Hungers weint Brühe
Flüssige Hundeaugen durch das Glas verschlingen deinen Knochen
Iss, mechanischer Arm, ernähre dich, Papierhand, es ist Zeit zu essen
Später wird es die Zeit der Liebe sein

Langsam erholen sich die Büros, und die Geschäfte, in unentschlossener Form, entwickeln sich
Das prächtige Geschäft schleicht sich in den Verkehr
Mengen, die es kreuzen, sehen es nicht, es ist farblos und geruchlos
Es ist verborgen in der Straßenbahn, hinter der Brise aus dem Süden
Kommt im Sand, am Telefon, im Kampf der Flugzeuge
Kümmere dich um deine Seele und ziehe einen Prozentsatz davon ab

Hör die schreckliche Stunde der Rückkehr
Mann nach Mann, Frau, Kind, Mann
Kleidung, Zigaretten, Hüte, Kleidung, Kleidung, Kleidung
Mann, Mann, Frau, Mann, Frau, Kleidung, Mann
Stellen sich vor, irgendetwas zu erwarten
Und verstummen, fließen Schritt für Schritt, setzen sich
Letzte Diener des Geschäfts, stellen sich vor, nach Hause zurückzukehren
Es ist schon Nacht, zwischen erloschenen Mauern, in einer vermeintlichen Stadt, stellen sie sich vor
Hör die kleine nächtliche Stunde der Entschädigung, Lesungen, Aufruf zum Casino, Spaziergang am Strand
Der Körper neben dem Körper, schließlich entspannt
Mit den Hosen ausgezogen der unangenehme Gedanke des Sklaven
Hör den Körper knarren, umarmen, zurückfließen
Irren in fernen Objekten und, unter ihnen, schmerzlos begraben
Sich dem anvertrauen, was mir wichtig ist
Vom Schlaf

Hör den schrecklichen Einsatz des Tages
In allen Ländern der menschlichen Sprache
Die Fälschung der Worte, die in den Zeitungen tropfen
Die unwirkliche Welt der Ämter, wo das Eigentum ein Kuchen mit Blumen ist
Die Banken zerdrücken sanft den Hals des Zuckers
Die Konstellation der Ameisen und Wucherer
Die schlechte Poesie, der schlechte Roman
Die Schwachen, die sich dem Schutz des Basilisken anvertrauen
Der hässliche Mann, von tödlicher Hässlichkeit
Spaziert im Boot
In einem unheimlichen Samstagabenddämmer

[VI]
In den Kellern der Familie
Orchideen und Optionen
Von Kauf und Scheidung
Die elektrische Schwangerschaft
Bringt keine Delirien mehr
Allergische Kinder
Werden getauscht; reformiert
Es gibt einen unerbittlichen
Krieg gegen die Kakerlaken
Es werden Geschichten erzählt
Per Korrespondenz
Der Tisch versammelt
Ein Glas, ein Messer
Und das Bett verschlingt
Deine Einsamkeit
Die Ehre wird gerettet
Und das Erbe des Viehs

[VII]
Oder es wird nicht gerettet, und es ist dasselbe, es gibt Lösungen, es gibt Balsame
Für jede Stunde und jeden Schmerz gibt es starke Balsame
Schmerzen der Klasse, blutige Wut
Und sanftes Gesicht und es gibt minimale
Balsame, zurückgehaltene, schändliche Schmerzen
Verletzungen, die keine Regierung genehmigt
Dennoch schmerzen sie
Unbestechliche Melancholien
Zorn, Tadel, Enttäuschung
Von diesem alten Hut, von der schlammigen Straße, vom Staat
Gibt es das Weinen im Theater
Auf der Bühne? Im Publikum? In den Sesseln?
Es gibt vor allem das Weinen im Theater
Schon spät, schon verwirrt
Es trübt das Licht, hüllt sich in Linoleum
Wird in den Lagerräumen, in den kolonialen Gassen, wo nächtliche Ratten umherstreifen, untergraben
Wird in der reifen Ernte, dem wogenden Mais
Und trocknet in der Sonne, in bitterer Pfütze
Und in dem Weinen mein spöttisches Gesicht
Mein Auge, das lacht und verachtet
Meine totale Abneigung gegen euren verwahrlosten Lyrismus
Der die Essenz der Diamanten selbst verunreinigt

[VIII]
Der Dichter
Lehnt jede Verantwortung ab
Im Marsch der kapitalistischen Welt
Und mit seinen Worten, Intuitionen, Symbolen und anderen Waffen
Verspricht zu helfen
Ihn zu zerstören
Wie einen Steinbruch, einen Wald
Ein Wurm

Escrita por: Carlos Drummond de Andrade